segunda-feira, 18 de março de 2024

Pergunta da neta

As crianças são imprevisíveis, como sabemos. Comprovando essa máxima, recebi a pergunta:

- Vovô, qual é a coisa de que você mais gosta na vida – não vale dizer gente da família nem amizades?

Estranhei a bem elaborada pergunta, vinda de quem possui 7 anos – a neta Laura.

Respondi, contudo, com a naturalidade do adulto que entende saber sobre tudo:

- Escrever, ler, trabalhar, caminhar, andar de bicicleta, e fui listando...

- Não, vô, não é nada disso. Sei que você ama outra coisa.

Interrompi: – já sei: é o fusca!

- Sim, é isso – observou Laura.

Aceitei que a razão estava com ela. A minha “joia preciosa”, além das pessoas ressalvadas, é, de coração, o querido fusca, ano 1977, na cor branca, perfeitamente cuidado pelo seu atual dono, e que ainda risca a cidade, sem causar problemas.

- Vamos, então, agora, dar uma volta com o fusca – fiz o convite.

Coloquei o “carrinho” na rua, e saímos pela orla da Barra da Tijuca, até a Pedra do Pontal, Rio de Janeiro, que ficou famosa na voz de Tim Maia, em sua canção “Do Leme ao Pontal”.

No caminho, toda animada com o passeio, Laura expressou-se, apresentando lindo rostinho:

- Vô, eu adoro este fusca!

 Se era assim, tive motivo para combinar, todo vaidoso, que, quando ela tiver a idade de possuir a habilitação de motorista, eu farei a transferência do carro para o seu nome, para que seja a dona. Claro, que a reação sobre o presente foi a melhor possível, mas não perdeu tempo em trazer condições:

- Adorei a ideia, mas precisarei fazer duas modificações: incluir teto solar e ar-condicionado. Ele é muito quente! E tem mais: a vida não é mole, não. Terei que gastar bastante dinheirinho.

Caramba! Ela, de imediato, pensou em melhorar o presente, até mesmo, antes de ganhá-lo. Revelei a minha surpresa diante de tanta iniciativa antecipada, e, em troca, recebi a confirmação: - vou fazer, sim!

A Laura já é um suco de sabedoria e firmeza. Ela sabe das coisas, embora em plena infância. O destaque foi a rapidez em propor mudanças.

Acrescentei que, no futuro, ela deverá ocupar-se dele, dar um trato: manter a limpeza, ir ao mecânico de vez em quando, guardá-lo à noite na garagem, etc.

Pensei comigo: tomara que o fusca aguente o tranco até lá, afinal, faltam 11 anos. A estrada será longa pela frente.

Refleti, também, sobre a possibilidade de ela desistir da ideia, ao fazer dezoito anos. Com certeza, existirão, na época, outros automóveis/veículos com muitas inovações e tecnologias, que deixarão o “branquinho” para trás.

Porém, ao fim da conversa, Laura foi categórica: - está combinado, vovô! Esperarei pelo presentão.

Por fim, balancei a cabeça, dando o meu consentimento, feliz da vida.

 = autoria de Alfredo Domingos, com a colaboração de Laura Silva, a neta =