terça-feira, 26 de setembro de 2017

Sirigaita Escalafobética


– Que “sirigaita escalafobética”, esta Juju!

A frase motivou risada da turma, na esquina das ruas Bartolomeu de Gusmão e Indaiá. Juju é conhecida no pedaço. Inclusive, já namorou alguns dos integrantes da roda de conversa. Ela mora no nº 38 da Bartolomeu. Seu caminho, então, é por ali, indo de ceca em meca.

Sem dúvida, é espevitada, sempre tramando espertezas. Fica à frente das novas ideias. Lidera as iniciativas. Promoveu comemorações durante os jogos da Copa do Mundo de Futebol; agitou festas juninas e julinas, também; arrecadou fundos para vizinho que perdeu tudo em incêndio na residência; e daí em diante. Para completar, não leva desaforo para casa. Responde na lata, tudo, em cima da bucha. É um tanto extravagante, estrambótica! A excentricidade inicia pelo cabelo vermelho, curto, e pelos piercings espalhados pelo corpo e termina na extensa tatuagem, nas costas, sobre a pele alva. De pernas longas e finas, vai de passo largo, traçando rumo, embora sem régua e compasso. Mas segue firme, não há o que lhe trave.

Pronto! Nos parágrafos acima, foi explicada, bem no feitio do “Aurélio” e na linguagem da moçada, a expressão “sirigaita escalafobética”. Legal, eu mesmo gostei! Fiquem à vontade para criar coisas do gênero, recomendo.

Alfredo Domingos

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Viajar é colocar reticências...

“Viajar é colocar reticências naquele momento de vida”. Penso assim e explicarei mais adiante.

Mas a escritora Martha Medeiros concebe diferente, uma vez que em nove de julho, escreveu na Revista Ela, de O Globo, que “viajar é abrir parêntese na vida”.

O tema, já deve ter sido percebido, aborda alguns dos sinais de pontuação, usados na Língua Portuguesa, inseridos completamente em todas as nossas atividades, na escrita e no falar, nem que seja na entonação.

Martha incluiu no texto certa aflição no antes do embarque e inquietação durante a viagem. Ela tratou do deslocamento aéreo, e o nosso foco será nele, também, para analisar da mesma forma.

Mas complementou, alegando que, ao chegar ao destino, livra-se de todo o peso e parte para aproveitar.
 
Bom, agora estou pronto para colocar o meu ponto de vista.

Primeiro dou o entendimento da gramática sobre reticências: indicam interrupção/fatos em curto espaço de tempo/supressão de um trecho.

Pois bem, aproveitemos o conhecer do professor Evanildo Bechara para fazer analogia com a temática da viagem: “interromper” pode está atrelado a deixar a sua rotina e resolver parar, ainda que temporariamente, para viajar. “Fatos em curto espaço de tempo” remetem ao próprio período do passeio, que geralmente é limitado, repleto de emoções, tendo a ver, obviamente, com viagem. “Supressão de um trecho” sugere deixar de fazer o de sempre, retirada de um pedaço com o qual você estava acostumado, o que perfeitamente se encaixa na continuidade da vida, que de repente perde o seu fluxo normal, em função da viagem.

Posso dizer que a gramática nos ajuda a sustentar a validade da ideia das reticências?

Digamos, todos, um grandíssimo “SIM”, pelos argumentos por mim apresentados acima.

Exponho agora a conotação de reticências, moradora no meu imaginário: adoto que as reticências são meninas recatadas, pra lá de educadas. Dão o recado nas entrelinhas, não escancaram objetivos, nem pressão; fazem suspense. Deixam a avaliação para o leitor. Interpretação livre. Carregam alegria ou tristeza. Oferecem liberdade, são democráticas. E andam em grupo, na formação de trio.

Viajar com base nas reticências aponta a dúvida sobre o que será encontrado, retrata a ansiedade e a expectativa por novidades. Por mais roteiro que haja, o inesperado assume grande impacto.

Já na ida para o aeroporto começam as traquinagens da empreitada. O transporte acontecerá dentro do combinado? Sem atraso? O “check-in” na companhia aérea não trará surpresas? As malas chegarão ao destino, sem mexidas do alheio, perdas, etc.? A passagem pela alfândega será normal? O passaporte passará incólume pelos controles virtuais, agora implantados? E, assim, as dúvidas vão se sucedendo...

Na decolagem do avião, você decide se entrega a Deus e relaxa ou morre logo de medo!

Uma vez nos céus, com a aeronave nivelada, surge um “certo” alívio, se os ventos e as turbinas estiverem favoráveis.

Boa sugestão ao viajante é que ele se entregue a Morfeu, Deus grego dos sonhos. Durma tranquilamente, ainda que de cabeça torta e pernas encolhidas.

Voltando à escrita da Martha, peço licença para discordar, quando ela afirma que, no destino, fica em estado de calmaria, descontraída. Não é bem assim...

Em terra, novas apreensões assolam, se conseguirmos chegar ao hotel sãos e salvos.

Abrimos mala, fechamos mala. Verificamos mais de duzentas vezes se ela está efetivamente trancada. Cá pra nós, em função da apreensão, esquecemos o segredo do cadeado ou não nos lembramos de onde deixamos a chave.

Não achamos aquela camisa preta, bem na hora de sair. Aí, optamos pelo ridículo, ficar descasados nas cores e nas indumentárias. Porém, não perdemos a pose, alegando:

- Turista é assim mesmo, de qualquer maneira. Não há quem ligue.

Compramos água na esquina pra economizar dinheiro do frigobar, mas não nos importamos em gastar pernas e paciência, na peregrinação, atrás de pequena economia. O que vale é pagar menos, em qualquer circunstância, embora desconsideremos a despesa de maior monta, já realizada, com passagem, hotel, etc.

A permanência no destino da viagem não é coisa de se tirar de letra. É tensa! Mil atividades, que mesmo que neguem, geram ansiedade e desconforto. Costumo brincar, relembrando os anúncios de turismo, em que alguns deles repassam viagens mirabolantes, do tipo: “realize o seu sonho, viaje conosco numa programação de dez países em nove dias”. Aí, vira correria infindável, sem proveito em parte alguma, entrando e saindo de hotel, além do rígido horário, de colégio interno, até para ir ao banheiro.

Para complicar o que é complicado, por si só, há outros inconvenientes: grupo grande deslocando-se, sempre com algum dissabor, longa espera até que todos estejam prontos ou que cheguem aos pontos de encontro, imprevistos de saúde, de dinheiro, de lidar com a língua estrangeira, e por aí vai... Sem nem tocar na tal doença do viajante, que faz com que o banheiro seja o recinto mais visitado. Que Louvre, que nada!

Essas aventuras sugam o ânimo do viajor. A diversão fica prejudicada pelas circunstâncias, a não ser que a pessoa releve tudo, passando por cima dos contratempos.

E vamos combinar que surgem, pelos caminhos, contratempos de “derrubar”, mesmo quando os envolvidos formam um animado time de turistas. Que tal topar com o furacão “Irma”, enlouquecido, desembestado por mares e terras?

Haja reticências para representar as surpresas, os sustos, mas, também, as alegrias de uma viagem!

Além de tudo comentado, existe, no meio do turbilhão de aventuras, a compra voraz de coisas que nunca serão usadas, não cabem no indivíduo presenteado ou não agradam. Surge, então, a clássica pergunta ao retornar: - Por que comprei isto, meu Deus?

Alfredo Domingos.

A idade é o de menos

Inferno... de garoto! Vive atrás de Julinha. Arruma mil motivos para estar ao lado dela.

Sempre dizendo:

- Ju, espere por mim.
- Ju, ajude na minha agenda.
- Ju, vamos estudar juntos.

Enfim, é assim! Numa pequena amostra.

Ela é quieta por natureza. Não diz taxativamente “sim” nem “não”. Simplesmente, faz companhia, vai no embalo.

A idade é o de menos. Estão no início da adolescência. A pureza mora ali. Mas o coração está disparando por tudo e por nada. Mais por tudo!

Não sabemos se é AMOR. Talvez... Porém, afirmamos que é um grude só. Nossa Senhora!

Ela muito delicada. Baixinha. Branquinha. Magra. Cabelos bem pretos.

Olhos vivos são a sua especialidade. Curiosos, em busca de coisas ao redor.

Usa em excesso o “por quê?”. Quer saber muito sobre os momentos e as circunstâncias que os preenchem.

Ele faz um tipo semelhante, mas com diferenças capitais, que veremos adiante. Ajeitado. Branquinho. Óculos. Cabelos alinhados, no estilo. Carregando a Infalível mochila, com o escudo do clube de futebol.

A dupla caminha pra lá e pra cá, dando risada. Andando para não chegar. Jovens olhares iluminam o caminho. O riso é misto de alegria e de nervoso.

Estão na fase lúdica de esconder material escolar, jogar bilhetinho na mesa do outro, fazer caretas e trazer o lanche de um para o outro.

Depois do primeiro semestre de aulas, após as férias, foram correndo para a porta da escola, ofegantes, ansiosos. Encontraram-se num profundo abraço, de perder o fôlego e de dar dor na boca do estômago.

Ela tem mãozinhas de dedos finos, com unhas rentes, cortadas até o sabugo, reminiscência do colégio interno.

Atende ao tilintar do WhatsApp no mesmo instante que ele a chama. Cumpre horários, chegando sempre adiantada, pronta para o que der e vier. Obediente às regras e responsável.

Ele é mais apressadinho, fere um pouco as horas marcadas, atrapalhado, e recorre a ela frequentemente. Mas há uma qualidade a destacar: usa de bom humor, sendo engraçado, espirituoso, quase irônico.

Suas notas nas matérias são menores do que as de Julinha. Isso importa? Não sabemos responder. As virtudes são múltiplas. Num casal, os complementos são essenciais. Não devemos dar peso às faltas e aos excessos. Estes estão presentes, certamente.

Fazem um par semelhante ao cantado pela banda “Legião Urbana”, em “Eduardo e Mônica”. O poeta expõe os contrastes. No nosso caso, pode igualmente ser que a “liga” da parceria esteja nas diferenças. Quer saber? Acaba dando certo!

Sexta-feira passada, na volta para a casa, os dois iam, como de hábito, com a conversa agitada, quando Marcelinho parou e pegou Julinha por um dos braços, mudando de assunto e atacando, direto e reto:

- Ju, vou perguntar: qual será o momento de darmos um beijo de verdade?
- Há quanto tempo estamos juntos (o termo “juntos” foi forte, mas...) sem que coisa alguma tenha rolado? Nem um beijo decente, “daqueles”.

Julinha permaneceu muda.

- Poxa, o que está faltando, caramba? (perguntou com ênfase)
- Nós damos beijos, sim, você esqueceu? - Ela respondeu tímida, falando baixinho.
- Sim, mas são beijos sem graça, no rosto. Parecemos, até, parentes ou amigos.
- Diga, quero lhe ouvir.
- Marcelinho, calma. Primeiro, faltou que você tivesse um pouco de “técnica”. Beijo não é para se anunciar ou perguntar a respeito. A vontade nasce. Evolui conforme a ocasião. E pronto, acontece! Ocorre que preciso me expressar sobre o quê sinto: ainda não estou à vontade para isso. Tenho, por enquanto, uma sensação esquisita. Entendeu?
- Bem, então precisamos meditar, “profundamente”, sobre o motivo de um beijo na boca ser esquisito. Podemos dar um tempo. Sei lá... durante essa reflexão toda. Só reconheço uma situação real: somos os verdadeiros “BV” (Boca Virgem).
- A nossa próxima atitude, sem dúvida, é sairmos daqui. Estamos no meio da calçada, com todos passando à volta, seu Marcelo Alcântara.
- Não se preocupe, resolverei a questão. A solução está nascendo. Vou dizer como:
- Escute, esse beijo virá, com certeza. Não fique assustada se surgir de repente. Cá pra nós, será muito bom. Afinal, representa o desejo de nós dois, não tenho dúvida. Deixe que viajemos na maionese, pois a dupla estará feliz. Risada!
- Venha, precisamos mesmo desocupar a calçada, Júlia Matos.

Alfredo Domingos