Cidinha, filha única, capitaneando a sua tropa
familiar, passou a semana fazendo contatos com os parentes para o almoço do Dia
do Pai. Vários telefonemas, muito uso do whatsApp, alguns “e-mails”, por fim, que
trabalhão!
Uns
queriam almoço em churrascaria, outros queriam um “churrasquinho” no play. Fechado!
A maioria venceu. Ficou para uma churrascaria do tipo rodízio, no Rio de
Janeiro, daquelas que ficam superlotadas.
Na
porta, a família esperou pela mesa mais de uma hora. Tudo
bem! Afinal, é dia de festa.
Sentados.
Pedidos chopes e outras bebidas. Todos com sede e fome. Os acepipes sobre a
mesa. Todo mundo “ataca”.
Silvinho,
o neto de quatro anos, colocado em uma cadeira alta para crianças. Agitado,
derruba, imediatamente, o pratinho de azeitonas. Tira batatas fritas com as
mãos, sem parar.
Silvio,
o pai, aquele cunhado inconveniente de quem ninguém gosta, estrategicamente
posiciona-se do outro lado, não está para incômodos; só para tomar chope. Foi
por isso que distanciou-se da sua família.
A
mãe do garoto, Magali, atrapalhada, querendo manter a finura, ralhando com o
filho o tempo todo, mal participa.
Rubão,
que de “ão” não tem nada, é magrinho e encolhido. Chega com flores para as
mulheres e loção pós barba para os homens, fazendo gentileza, como é do seu
jeito.
“Maria
dos Anjos”, de nome tão puro, estudou em colégio religioso. A neta, criada para
ser “lady”, hoje é “rave”. “Piercings”, vários, que geraram em uns, agrado; em
outros, estranheza. Tatuagens espalhadas pelo corpo. Cabelo nas cores vermelha
e laranja, uma novidade! A roupa preta e não faltam as botas, é claro!
Cícero,
um tio esquisitão, que vai a todos os eventos da família, diz que não liga para
comida e que parece um passarinho, pela pouca quantidade que belisca. Na
verdade, é um “morto de fome”. Metido a polido, mas não rejeita prato algum!
Tia
Leontina, figura de Fellini, viúva de dois maridos, volumosa, suarenta, cabelos
negros e compridos. Fala compulsivamente. Cospe na mesa toda, porém é “suportada”,
pela generosidade. Possui duas pensões e uma aposentadoria - estamos antes da
reforma da Previdência - “Cheia do ouro”, como dela falam.
Lá
pelas tantas, Magali clama a Silvio que fique com Silvinho: -
Poxa, estou que não me aguento. Não consigo comer com este menino que é um
“inferno” e você aí, distante, feito um nababo! Ele é seu filho também,
gracinha! Assim não venho mais... Silvio
não se abala, representado pelo interesse de tomar uma “grana” do cunhado,
Eduardo, empresário de sucesso, que é querido por todos.
Vó
Isaura já veio almoçada. Portanto, só pede uma asinha de galinha, bem
tostadinha. Fica querendo. A asinha não chega. Acontece...
E
o chope rolando...
Rosa
Maria, prima solteira, mas não solteirona, com seus quarenta anos, bonita,
esguia, ar enigmático, tendo mãos bem desenhadas, que falam. Guarda segredos
que despertam curiosidade. Bem postada na vida, como se diz. Ajuda a quem
precisa. Age sutilmente. Come o suficiente, com elegância. Trouxe recadinhos
escritos para os pais. Tia Leontina até fez referência: -
Rosinha não se esquece das pessoas; ela é ótima!
Ricardo
e Osvaldinho são primos. Um flamenguista e o outro vascaíno. Comendo e
discutindo futebol. Discutindo futebol e comendo. Fazendo apostas. Colocando
desafios.
Sarita,
menina ainda, derruba o guaraná, que escorrega e vai direto para a calça
branca, de ir à missa, do tio Cícero. Ele sorri amarelo, não reclama! Seca com
o guardanapo.
A torta aparece para selar a data.
Chocolate. Morangos. Creme. Presente o canto de parabéns!
Hora
de pagar a conta.
Silvio
disse que não bebeu aqueles nove chopes que lhe atribuíram. Ele não concordou: -
Tem erro nisso aí. Outra pessoa refaz a conta. A
discussão toma corpo.
Rosa
Maria deixou mais dinheiro do que lhe cabia. Mandou um beijo de longe e foi
embora. Esquiva-se de confusão.
A
conta não chega a termo. Discordância.
Eduardo,
ele sim, o empresário, passa o cartão, metade de todo o valor, e sai. Outro que
se desenrola de enrolação. Pelo jeito, avalia que aborrecimento por pouca coisa
a menos não vale a pena.
Alívio
para o resto da turma esperta. A conta fecha.
Ufa! As
pessoas começam a despedir.
E as flores? Ficam
sobre a mesa. Rubão fez o seu papel, não importando o proceder
dos demais. No entanto, o encontro familiar, mesmo tumultuado, deve ser
preservado.
Até
o próximo ano!
Observação:
muitos nomes desfilaram pelo texto acima. Próprios das famílias. Muitas circunstâncias
foram comentadas. Próprias das famílias.
Desses
momentos, o que efetivamente resta é a confraternização. O encontro das pessoas
faz as datas. Pode chamá-las, as datas, de comerciais, exploradoras, o que
for... mas são praticamente elas que unem os membros das famílias, ao
longo do ano. Sem elas, os encontros seriam muito mais raros.
Alfredo Domingos