terça-feira, 28 de abril de 2015

Palavra-ônibus

Fonte da magem: www.etimologista.com
De cá pra lá e vice-versa, matutando, criando sulco no chão, dei com o bestunto num substantivo muito significativo, que é a “palavra-ônibus”.
- Hum, não é que dá caldo! – expressei.
Ela é instigante e, ao mesmo tempo, muito bonita. Sua composição revela a ligação da diversidade de significados, que uma única palavra pode ter, com a grandeza do ônibus. O veículo, como sabemos, abriga coisas e gente à larga, surgindo daí o respaldo para fazer parte e bem representar a variedade de ideias residente na palavra.
Algumas palavras ficam para sempre. Outras caem em desuso. E, ainda, há as que vêm sendo transformadas, assumindo interpretações diferentes.
“Amor” é para a eternidade. “Boco-moco” (brega) saiu do uso. E a “palavra-ônibus” é a expressão da mudança.
Alguns exemplos de “palavra-ônibus”:
- bacana – que é aplicada para designar a pessoa bem vestida; rotular o sujeito esperto, com a conotação pejorativa; demonstrar o mérito de um grandíssimo professor; enaltecer uma boa moradia; ressaltar que a pessoa é bem-educada; e por aí vai;
- aposentadoria – que tanto significa sair do trabalho ativo como é empregada para dar pouso; fazer pausa; e, até mesmo, cessar alguma coisa;
- complicado – que se por um lado indica situação embaraçosa, pode indicar pessoa de gênio instável, e, também, atividade de difícil solução;
- envolvente – que abarca, no sentido de proteção; que alicia, no jeito negativo da corrupção; que atrai, com sedução; e que passa a lábia, obtendo algo por astúcia;
- legal – que se submete à lei, o mais comum; mas cabem as formas de perfeição, de lealdade e de dignidade. Não há, no entanto, como esquecer a relação com o bonito e com a corriqueira expressão “Fulano é gente boa”. Tudo no mesmo pacote.
Porém, a melhor palavra-ônibus, a rainha delas todas, que broca doidamente a minha cabeça, é “coração”, que consegue reunir infinitos sábios significados. Alguns deles estão formulados:
- venha cá, meu “coração”;
- não magoe o meu pobre “coração”;
- digo-lhe, de “coração”, que é verdade;
- saio da relação de “coração” limpo;
- juro, de “coração”, que a coisa foi assim;
- em “coração” de mãe sempre cabe mais um;
- é com o “coração” apertado que me despeço;
- o prédio da Prefeitura é o “coração” da cidade;
- mentira de “coração” não é maldosa; e
- cumpro o dever de abrir, despudoradamente, o meu “coração”.
Que a moda pegue! É a minha dica.
Pense você também nas “palavras-ônibus” que circulam por aí.
A cada parada, a cada semáforo e a cada esquina elas surgem. Que tal pegar carona?!
Alfredo Domingos

Cadela vai à Justiça


A cadela “Pretinha” está nas barras do Tribunal! Como?!
Ela foi acusada, a princípio, injustamente. Seu dono recebeu a intimação gerada pelo vizinho. O teor do documento assinala que “Pretinha” matou doze galinhas de Julião, o desesperado proprietário das penosas. A confusão ocorreu no interior do Rio de Janeiro.
A Defensoria Pública do Estado alegou que as galinhas são o ganha-pão do reclamante, e, em decorrência, solicita conciliação pecuniária.
A qual ponto nós chegamos! Há tanto bandido solto, e querem trancafiar a “Pretinha” ou levar dinheiro do seu dono! A Justiça já anda emperrada sobremaneira, não necessitando de mais procedimentos para lhe atravancar os trâmites.
Américo alega em defesa da cadela que o seu animal não invade terreno alheio, em função de robusta cerca. Em acréscimo, oferece como prova a inexistência de penas no quintal. Ainda, rebate a ofensa, indicando que as galinhas são abandonadas à própria sorte por Julião, que, na verdade, não cuida como deveria daquelas que lhe dão o sustento.

- Elas são umas rueiras, isso sim! – pragueja Américo, danado da vida.

Exageros à parte, confesso terlido notícia sobre ladrão de galinhas, mas   envolvendo quem as comesse vivas é novidade. Quersaber? Lamento a situação dos dois lados. Coitadas das galinhas, devoradas! E pobre da “Pretinha”, se tiver levado má fama sem proveito!
Em consequência, os dois “patrões” terão que seguir o caminho da rinha. Cada “galo” buscará o seu direito, afinal a culpa sempre é de gente tamanhona.
Pesquisa: feita no jornal EXTRA, de 17/10/2014, página 4, artigo de Igor Ricardo.
Alfredo Domingos


A vida é...


Aproveitei o aniversário da minha filha para passar a ela o que o meu sentimento estava pedindo no momento. Então, foi feita uma carta, em forma de poema. Transmito a todos a mensagem. Usem-na, se gostarem!
A vida é feita de pequenas coisas, que viram grandes porque nós as valorizamos:

O “bom-dia”
O beijo na testa
O “obrigado”
O “pensei em você”
A chuva na vidraça
O sol no rosto
A lágrima que corre
O soluço fora de hora
O tombo na soleira
O bilhetinho recebido (e o entregue também)
As mãos entrelaçadas
O aperto de mãos
A dor da saudade
A alegria do reencontro
O piscar de olhos
O nariz arrebitado
O trocar de bem
A entrega do presente
A meditação
O tagarelar
O silêncio
O “venha tomar café comigo”
O quindim reservado
O sanduíche dividido
O riso frouxo
A ruga na testa
A batida nas costas
Os pijamas lado a lado
A nota boa na prova
O susto da entrada súbita
A foto no quadro imantado
E, sempre, o amor! Nas mais diferentes formas. Até nas pequeninas demonstrações.
Fazer a vida é essencial. Ela é, afinal, do que jeito que você a faz.


Alfredo Domingos

sexta-feira, 17 de abril de 2015

Lira Paulistana (homenagem ao seu autor)

Fonte da imagem: www.tribarte.blogspot.com (arte da Tarsila do Amaral)

Quando eu morrer quero ficar,

Não contem aos meus inimigos,

Sepultado em minha cidade,

          Saudade.

Meus pés enterrem na rua Aurora,

No Paissandu deixem meu sexo.

Na Lopes Chaves a cabeça

          Esqueçam.

No Pátio do Colégio afundem

O meu coração paulistano:

Um coração vivo e um defunto

          Bem juntos.

Escondam no Correio o ouvido

Direito, o esquerdo nos Telégrafos,

Quero saber da vida alheia,

          Sereia.

O nariz guardem nos rosais,

A língua no alto do Ipiranga

Para cantar a liberdade.

          Saudade...

As mãos atirem por aí,

Que desvivam como viveram,

As tripas atirem pro Diabo,

Que o espírito será de Deus.

          Adeus.
Mário de Andrade

Fábula – O fiel escudeiro

Não há outro aio igual ao coelho Ladislau! (até rimou)

Usando apurada sagacidade, segue livrando-se de qualquer encrenca. Um bom expediente aqui e outro acolá, sem perder o humor e a disposição em servir.

Quando o seu dono não consegue resolver alguma dificuldade, lá vem Ladislau com a solução.

Por hábito, fornece ideias por meio de perguntas, evitando o comprometimento direto, para colocar o patrão bem à vontade, sem melindres com as propostas apresentadas por ele, dando chance à reflexão e à percepção de que o teor da conclusão é exclusivamente dele.

Deixa estar, no entanto, que Ladislau induz para aquilo que julga ser o melhor, exercendo peremptoriamente o princípio da lealdade.

O coelho, nos seus botões, sabe do valor da sua influência, mas dispõe de arte bastante para fazer com que o aconselhado fique orgulhoso da possibilidade de sozinho chegar a bom termo.

Várias histórias têm final feliz em consequência da sábia assessoria do coelho. Estão selecionadas, porém, apenas duas para representarem a discreta e eficaz interferência do nosso amigo:

A primeira

- Irei à cidade, mas parece que o céu desabará, de tanta chuva que virá (outra rima). Não sei se levarei o incômodo guarda-chuva – expôs dúvida o dono do coelho.

Mais que depressa, Ladislau atalhou:

- Meu senhor, não carece de preocupação por questão tão banal. Não precisa levar o guarda-chuva, elemento por demais atrapalhante. O senhor não acha que vestindo a capa plástica estará protegendo-se do frio, que tanto lhe incomoda, e ao mesmo tempo preparando-se para a chuva, se ela vier?

- Deixe-me raciocinar, fiel escudeiro... Realmente, cabe o uso da capa, pois ela estará abrigando-me dos dois efeitos da natureza, além de permitir livres movimentos, sem que precise carregar o embaraçoso equipamento. Será o que farei!

A segunda

- Penso em demitir o capataz da fazenda. O homem está velho e, além disso, recebe o maior salário de todos. Meus cofres não estão suportando tamanha despesa. Dividirei as suas atividades pelos outros trabalhadores, que obterão resultado semelhante, continuando com os seus mesmos salários. Terei, assim, alívio financeiro – levantou a hipótese o chefe.

- Tenho observado todas as provas de fidelidade e dedicação por parte do capaz, que conhece como ninguém o andamento da lida, liderando o grupo com competência, além de ter pessoalmente salvado um dos seus bezerros, arriscando a própria vida, quando o animal jogou-se no rio. O homem não está velho, imprestável; na verdade, possui larga experiência. Acrescento, ainda, que não podemos esquecer que a filha do capataz é cozinheira de mão cheia, de cujo fogão saem delícias para o seu regalo, meu patrão. Fica a pergunta: o senhor está avaliando a perda de um valoroso auxiliar e, também, a falta que Rosinha lhe fará por não estar mais à frente dos maravilhosos quitutes? Reconheço, contudo, que as finanças da fazenda são da sua alçada. O que sabe um desavisado coelho sobre contas? - arrematou o ladino Ladislau.

Em seguida, o patrão alegou a necessidade de analisar com mais detalhes a decisão que estava por tomar.

Havendo dúvida, a pessoa sensata pede tempo. Trata-se de excelente medida. Dar tempo ao tempo é uma das saídas inteligentes para qualquer tema, a não ser que seja providência de momento, inadiável.

Para fechar o assunto, claro, que o capataz não foi demitido!

Moral da história: a opinião pode surtir efeito ou não, basta ser fundamentada em argumentos pertinentes. Quem está com o problema, às vezes, não considera todos os aspectos. Nesse momento, alguém de fora pode ajudar. Cabe ao aconselhado avaliar e decidir, sem pressão, ficando confortável quanto a sua decisão, que tem cunho estritamente pessoal. A partir daí, pronto, quem aconselhou fica isento.

O segredo é permitir ao outro a oportunidade de refletir e por si só encontrar o caminho a seguir.

 Alfredo Domingos

A Banda

Fonte da imagem: www.mar.mil.br/cgcfn/cfn/bandas.htm

A música “A Banda”, de Francisco Buarque de Hollanda, é emblemática na discografia brasileira. A canção foi inscrita no II Festival de Música Popular, chegando à vitória. Fez um grande sucesso! Vendeu cinquenta e cinco mil cópias em apenas quatro dias. Promoveu um agito só!

Até hoje, após quarenta e oito anos, ela faz com que nos balancemos de imediato, assim que começamos a ouvir os seus primeiros acordes. Trata-se de música “musical”, desculpem-me a redundância, marcial e solene. Ao mesmo tempo, apresenta um romantismo provinciano. Qualquer música traz boa mensagem, mas esta, em especial, tem o poder de arrebatar o ouvinte.

Sua letra já começa fazendo um convite ao amor, no embalo da música: “O meu amor me chamou pra ver a banda passar cantando coisas de amor”. Que coisa linda, não é?

O autor não ficou por aí, foi muito além!

Argumentou, na sua poesia, que “A gente sofrida despediu-se da dor para ver a banda passar”. Entendeu ele que era necessário sair da peleja para entrar na alegria de sorrir, brincar e cantar, afastando o povo amuado da dor que corrói.

Aliás, cabe dizer que “ver a banda passar” não significa estar à margem, não, de jeito algum! Podemos muito bem entrar nela e tomar para nós todas as emoções advindas.

“Ver a banda passar” foi uma solução divina que o nosso Chico Buarque encontrou para dar a impressão de desfile, de parada, aonde, na realidade, qualquer um pode participar de lá para cá e vice-versa.

Todos nós devemos, mesmo, entrar na onda da banda, sem distinção. Tanto é assim, que a letra inclui “o homem sério, o faroleiro, a namorada, a moça triste, a meninada, o velho fraco, e, ainda, a moça feia”. Sem exceção, eles deixaram seus momentos e apreensões para cair na folia.

Engano será de quem pensar que me esqueci da rosa triste. Esqueci, não! Tenho pra mim que nenhuma flor consegue entristecer. Deixei ao largo de propósito. Perdoa-me, caro Chico!

Considero a natureza livre de amofinamento. Isto é coisa de gente!

Adiante, Chico Buarque deu para matar! Juntou “marcha alegre se espalhando na avenida com a lua, de cara de fora, sorrindo”. Covardia, prezado poeta!

Porém, para o entendimento popular o que é bom dura pouco. Dito e acontecido!

A corneta da mudez tocou simbolicamente o silêncio.

A banda passou! Levou no seu bojo a animação, dando espaço à tristeza. Cada envolvido, então, sem outra saída, retornou ao seu comum, no seu canto.

“A Banda” ganhou o Festival, conforme comentado,  no mesmo ano de seu lançamento (1966), tendo sido interpretada por Chico Buarque e  Nara Leão. Dividiu o prêmio com a canção Disparada, de Geraldo Vandré e Théo de Barros, esta interpretada por Jair Rodrigues. Uma disputa acirradíssima dividiu os assistentes, na apresentação final. 

Vale ressaltar a participação dos dois grandes intérpretes, já falecidos, que fincaram, com destaque, os seus nomes na MPB, Nara e Jair. Fiquem em paz!

Finalmente, é bom explicitarmos que a escolha de tratar desta música não foi ao acaso. Houve motivação pela comemoração dos setenta anos de Chico Buarque, que ocorreu em 19 de junho de 2014.

Felicidades, Chico! Não se esqueça de continuar brindando-nos com as suas composições, sempre maravilhosas.

Alfredo Domingos


 A Banda

Estava à toa na vida
O meu amor me chamou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

A minha gente sofrida
Despediu-se da dor
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O homem sério que contava dinheiro parou
O faroleiro que contava vantagem parou
A namorada que contava as estrelas parou
Para ver, ouvir e dar passagem

A moça triste que vivia calada sorriu
A rosa triste que vivia fechada se abriu
E a meninada toda se assanhou
Pra ver a banda passar
Cantando coisas de amor

O velho fraco se esqueceu do cansaço e pensou
Que ainda era moço pra sair no terraço e dançou
A moça feia debruçou na janela
Pensando que a banda tocava pra ela

A marcha alegre se espalhou na avenida e insistiu
A lua cheia que vivia escondida surgiu
Minha cidade toda se enfeitou
Pra ver a banda passar cantando coisas de amor

Mas para meu desencanto
O que era doce acabou
Tudo tomou seu lugar
Depois que a banda passou

E cada qual no seu canto
Em cada canto uma dor
Depois da banda passar
Cantando coisas de amor

Pesquisa: Wikipédia

terça-feira, 14 de abril de 2015

Risco do quê?

Perguntaram, outro dia, sobre o que eu achava adequado dizer. Fulano corre risco de vida ou de morte?

Os meios de comunicação, TV, rádios e jornais, adotam as duas formas, com leve predominância, ultimamente, para fazer a morte correr risco. Não sei se confundem ou se consideram que tanto faz.

Nas indústrias, principalmente, a famosa placa indicando PERIGO, com a caveira e os dois ossos, alerta para o RISCO DE MORTE. Apavorante, assim!

Sacudi a cabeça de cá pra lá e de lá pra cá, e resolvi, por minha conta e risco (este risco não é de vida nem de morte), que o plausível é dizer "Fulano corre risco de vida".

Dou a explicação: a vida é que pode ser abatida ou abalada por vários motivos - negligência, imperícia, imprudência, falta de sorte, doença, etc.

Nas entrelinhas, fica entendido que algo (a vida) será perdido e faltará para sempre.

A morte, por sua vez, não oscila nem é ameaçada. Ela fica ali, parada, sinistra, esperando o vacilo da vida para aniquilá-la. A não ser que consideremos que há o risco de a morte vir a ocorrer, o que requer muita estripulia mental. 

De toda forma, pobre vida, agourenta morte!
 
Alfredo Domingos

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Criatividade e natureza lado a lado

Fonte da imagem: www.purebreak.com.br
 A criatividade do artista, notadamente o de rua, que é livre no cenário de espaços ilimitados, alcança resultados inimagináveis. Este grafite representa fielmente por aonde caminha a imaginação solta do grafiteiro.
A natureza se faz presente de forma pujante, participando como se fosse a cabeleira vasta do retratado. Cabeleira, vamos e venhamos, desgrenhada, e, acima de tudo, afinada com as ideias irreverentes. Modernidade pura!
O grande barato está na ocultação do tronco da árvore, que ficou camuflado pelo muro, passando o sentimento de que a copa está solta, apenas ornamentando o rosto marcante e ousado. Bela concepção!
A pintura do rosto do homem carrega um tanto de arte asteca, outro tanto de coisa alguma, mas o conjunto é perfeitamente harmônico. Seja o que for!... No mínimo, houve preocupação em dar cor. O que ficou bonito!
Para terminar a análise do grafite, vale comentar que a coloração dos olhos foi bem pensada. Em cor clara, esverdeada, conferem um bom efeito, no contraste com a pele escura do homem. A combinação olhos com o tipo de pele permite, até, que pensemos em um cidadão de origem estrangeira. Uma junção, por uma dessas estripulias da vida, de mãe francesa com pai mouro, quem sabe?!
Grafite é arte! Não pode haver dúvida. O artista, que não conseguimos identificar, mas recebe a nossa homenagem da mesma forma, esbanjou o espírito observador e o senso de oportunidade. Sacada semelhante surge de tempos em tempos, muito espaçadamente. Praticamente, foi inspiração única, talvez do divino.
Deve ser confessado que gostaríamos de ser vizinhos desta obra. Já imaginaram a satisfação de termos à frente, permanentemente, a magnífica figura? Bom por demais!

Alfredo Domingos

A natureza imita a vida?

Fonte da imagem: fotografia feita pelo autor.

A natureza imita a vida ou a vida imita a natureza? Sei lá… Não convém lucubrar.

Caminhando pela Rua Sorocaba, Botafogo, na cidade do Rio, deparei-me com a árvore da imagem aí de cima, na altura do número 190. Uma senhora árvore. Bonitona! Fiquei pensando que a árvore, com a ajuda laboriosa das raízes, busca vida, espaço e completude, entre outras coisas.

Os humanos também têm necessidades semelhantes, no mesmo emaranhado, na mesma disputa desenfreada das raízes da planta, numa confusão enlouquecedora. Mas existe a desvantagem de precisar obrar, ralar, como se diz comumente.

A resolução dos interesses das pessoas não é tarefa fácil. Várias searas são envolvidas, desde a gestação até a situação de idoso. Não há como não interagir. O isolamento é fatal para o indivíduo, que, por mais que recuse, não consegue progredir sem a colaboração de alguém: a mãe, a professora, o síndico do edifício, o patrão, o agente público, o médico, o marido, o próprio filho, e por aí vai…

Com a nossa amiga árvore, ocorre diferente. Ela consegue viver com muito pouco. Silenciosamente. São necessários, basicamente, ar, sol, água e terra, com incômodo mínimo, resolvendo-se sozinha. Até acontece o contrário, são as pessoas que perturbam a mansidão da planta. Dá para observar na foto que a expansão da árvore está contida pelo canteiro feito na calçada. A bonitona está encurralada, safando-se do jeito que pode.

Caso fosse a situação de um “senhor” humano, ele destruiria o empecilho, romperia o obstáculo e sairia arrotando bravura. À coitada, por outro lado, só resta conformar-se e proceder da forma que Deus permite.

Cabe comentar o costume de uma amiga de origem oriental, Yeda, que, quando estava aborrecida ao dormir, deitava sob uma pequena árvore da sua sala, no chão – não sei se de quimono… Dizia, candidamente, que ao acordar estava renovada, leve. Santa companheira! Recordo-me da nora Luciana, que, ao fazer a mudança da cidade de Niterói para o Rio, não se esqueceu de Gertrudes, árvore do seu xodó.

Aproveito para narrar história pitoresca sobre a tal Gertrudes: no transporte, em plena ponte Rio-Niterói, a árvore, instalada na carroceria da picape, balançava cordialmente a copa, no embalo do vento, como no gesto de cumprimentar a todos, expressando-se numa delicada saudação. Parecia uma imponente porta-bandeira, cumprindo o seu desfile.

Voltando à nossa árvore, lá de Botafogo, se fosse para dar-lhe nome, não hesitaria. De pronto, pediria licença às “Severinas” deste Brasil para usar o nome. Sim, batalhadora e persistente, não caberia a ela outro chamamento. Antes de ir embora, confesso, não vacilei. Dei aquele abraço apertado na Severina. Que fique em paz!

Pois é, caminhando encontra-se, e encontrando comenta-se. Fala-se, graças a Deus, ainda, da natureza, mesmo sofrida, porém, presente, sendo testemunha muda da nossa complexidade, criaturas deste planeta.

Alfredo Domingos

domingo, 12 de abril de 2015

É trem, é trilho...


Estação inicial
Estou no Metrô Rio.
Os “tipos” vão chegando
São seres isolados fazendo a massa.
A lufa-lufa começa cedo e vai até tarde da noite. É o vai e vem febril.
O condutor se apresenta tal e qual comandante de aeronave.
Sai o trem.
É trem, é trilho...
Barulho interno. São vozes.
Lá fora o som é abafado.
A escuridão vai sendo rompida.
O interior é iluminado.
Todos carregam alguma coisa
São mochilas
Bolsas femininas
Pastas de documentos. Embrulhos.
É trem, é trilho...
Estações várias. Tantos nomes
Há nome de praça, bairro, rua, presidente. Tantos.
Para na Central. Lota em direção à Zona Sul.
É trem, é trilho...
Gente sussurrando. Gente falando alto.
Olhares distantes. Olhares atentos, curiosos.
Casal apaixonado. Olhos nos olhos. Testas encostadas.
Tem jornal aberto. Há quem de soslaio leia as notícias.
Gentileza não falta. Alguém segura pertences dos outros.
Moço fica de pé. Aí, o velho senta.
É trem, é trilho...
Casacos vestidos. Nas costas. Nas mãos.
Vejo sandália. Tênis é o que mais vejo.
É trem, é trilho...
As cabeças fervem. Essas não sossegam, mesmo com os olhos fechados.
Desemprego. Pressa. Paixão. Ciúme. Raiva. Tarefa. Alegria. Tudo ali!
Estou saindo. É preciso.
E a viagem prossegue, levando gente!
É trem, é trilho, é lata...

Alfredo Domingos

sábado, 11 de abril de 2015

Paciente errado

Vivia de boca amarga e com dor de cabeça incomodativa, além de alguns desconfortos na altura da barriga. Cidinha procurou o médico. Realizou a tal bateria de exames. Ficou, então, sabendo de que precisava de cirurgia na vesícula.
Virou-se daqui e dali para resolver a questão do plano de saúde modesto, frequentemente rejeitado, na procura de um hospital que o aceitasse.
Finalmente, tudo se arranjou e foi marcada a intervenção.
Entrou em cena o marido, aprontador de várias encrencas, figurinha carimbada como dizíamos antigamente, nos tempos da brincadeira de bafo.
Babinha, apelido dado desde novo ao anão Rodolfo, em função da lábia para alcançar seus intentos, encheu-se de brio para acompanhar a “patroa”. Malandro escolado, não permitiu a outra pessoa o papel de guardião. Ofereceu-se de pronto para estar com a mulher no internamento.
No dia marcado, providenciada a internação hospitalar, Babinha postou-se ao lado da cama, com pose de fiel escudeiro, lançando mão de um pano para enxugar a testa de Cidinha. Ela até achava graça por tanto desvelo.
O marido ficou atento à preparação, não se desgrudando do leito. Chegou, porém, a hora de dar o famoso “sossega-leão”, sublingual, à paciente. Procedimento este anterior à ida para o centro cirúrgico. Foi recomendado que ela ficasse deitada, pois o efeito seria forte. Bater e valer!
Com o comprimido já se desfazendo na boca, lembrou-se Babinha de dar aquele beijo de despedida temporária e de boa sorte. Não poderia deixar de comparecer com o apoio. Imagine se iria perder a chance de marcar a presença?
Na ponta dos pés, esticando-se todo para compensar o pequeno tamanho, aprontou os beiços e tascou um caloroso beijo, apaixonado. Varreu amorosamente a boca de Cidinha, fazendo o “língua com língua”.
Em seguida, a paciente foi conduzida à cirurgia.
De começo, Babinha acelerou-se a rezar pela boa condução dos procedimentos. Sua fé estava no espiritismo, mas, nas aflições, recorria a qualquer religião. Pai-Nosso e Ave-Maria eram proferidos sem recato, com uma das mãos voltada aos Céus, no pedido de proteção. Porém, sem se esquecer de segurar a guia espírita com a mão restante.
Em pouco tempo, contudo, foi ficando sonolento, estranhamente. De pé, ainda, viu-se perdendo as forças. Entendeu que era melhor buscar amparo no sofá do acompanhante. Jogou-se como conseguiu.
De certo, absorvera a substância receitada à mulher. Claro! Na ânsia do beijo, distraiu-se, e de quebra ganhou a pré-anestesia desnecessária. Tanto que desejava participar, que acabou comprometido. Mergulhou no sono absoluto, em situação de derrota total. A soberba foi por água abaixo!  
Cidinha safou-se do mal que lhe perturbava a vida, teve a cirurgia bem-sucedida, e voltou ao quarto. Ficou surpresa em verificar que o acompanhante estava entregue aos braços de Morfeu, desligado da tomada. Ressonava. Nada o acordou.
Coube à Cidinha conformar-se, balançando a cabeça com a expressão do tipo “que papelão, hein?”. Foi assistida pelas enfermeiras até o dia seguinte. Nada lhe faltou, graças a Deus! Caso dependesse de Babinha, a coitada estaria em maus lençóis.
Noite bem resolvida. Manhã clara!
Cidinha ficou pronta para a alta. Poderia deixar o hospital a qualquer momento. Mas não o fez. O que a impedia? Cabe a pergunta, sem dúvida.
Babinha era justamente o elemento atrapalhante. O sujeito, ainda dormindo, permanecia alheio a tudo.
Problema criado, solução dada. O paciente certo ficou liberado para ir embora, mas o paciente errado deveria obter condições para se ausentar com as próprias pernas, saindo da sonolência profunda.
Mas a circunstância embaraçosa, ainda, levantou importante detalhe: o beneficiado pelo plano de saúde não mais necessitava dele. Quem dependia de internação era inoportunamente outro, não autorizado pelo convênio médico.
O quê fazer? Diga, aí, se for capaz!
Alfredo Domingos

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Os pequenos detalhes fazem a diferença

Em 11 de novembro do ano passado, listei em uma folha de post-it quatro tarefas (chamei-as de pendências) atribuídas a mim, consideradas quase impossíveis, que virariam, num estalo, um desafio para o cumprimento. Grandiosas montanhas a escalar.
Foram submetidos à relação grandes empreendimentos aos quais eu teria de devotar engenhosidade, esforço e tempo. Em outras palavras, coloquei a minha própria cabeça a prêmio.
No meio deles, estão, ao menos, dois, que são coisas de uma vida, como se eu tivesse de plantar uma árvore, fazer um filho, ou algo significativo assim.
Em fevereiro, escrevi a lápis, em letra miúda, o seguinte lembrete: “por enquanto, nada!” (foi um aviso, apenas)
Podem perguntar-me se está havendo falta de empenho, que usarei um grandessíssimo “não” como resposta. Na batalha em chegar lá, suo o bigode, caso fosse dono de um, a cada dia. Insistir é comigo, não deixo pra outrem.
Quando considerei que havia pela frente pendências, enganei-me rotundamente. Pendência é passageira, dá a ideia de acessório, de coisa de somenos importância, o que, positivamente, não exprime a realidade das minhas fainas.
Neste dia de abril, verifico que não consegui colocar gaivota de conclusão de eventos em qualquer deles. Ainda estou pelejando. Terrível fadário o meu! Sem considerar que a Páscoa está chegando e que tenho comigo a imposição de cumprir obrigações até a ressurreição do Senhor; sempre pensei assim, ou no máximo o prazo se estende até o Natal. Mas esta última data ainda está longe. Será que ficarei empatado por tanto tempo?
Matutando, cheguei à conclusão de que a vida não encontra leito nos grandes acontecimentos. Não é a toda hora que se perde emprego, muito menos vivemos a ter a casa incendiada. Os infortúnios de monta são escassos, graças a Deus!
A vida é coalhada de miudezas. A torneira que pinga. As contas para pagar. A condução que atrasa. O salário para esticar. O banho para tomar. As unhas para cortar. E assim são múltiplas e constantes as imediatidades.
Então, essas tais coisas a dar cabo, da minha lista, talvez não sejam tão imprescindíveis, tampouco imediatas. A obrigação de resolvê-las não deve ameaçar a minha tranquilidade. Calma, devo dizer a mim mesmo!
Igualmente a um urso que hiberna, posso deixar a lista no canto, a repousar. Não preciso estar com faca às costas, cobrando-me solução. De vez em quando, lembrar-me dela não faz mal, serve de estímulo a algum movimento positivo, quem sabe?!
Ou, pensando melhor, a saída esteja em reformular a lista, hein???
Alfredo Domingos

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Palavras, maravilhosas palavras

Outro dia, comentei que a inspiração do escritor tem o toque Divino. E reafirmo. A concepção do enredo, o jorrar das ideias, o arranjo das palavras e a montagem do texto, tudo isso não é ao acaso.

Claro, que tem a maestria do autor, os seus dom e experiência, mas há de ser considerado o imponderável, aquilo que foge ao controle, quase como um cochicho ao pé do ouvido, de uma voz longínqua. Esse fator aleatório, no meu entendimento, vem dos Céus, sejam eles quais forem.

O escritor Túlio Bacamarte, das minhas relações, vive dizendo que escrever está além da imaginação. Ele conta que vez por outra é ungido com um tema para tornar realidade, para dar corpo por meio de bem traçadas linhas, que ele nem sabe como conseguiu idealizar e passar para o computador. Para realçar, ele estala os dedos da mão, fazendo o sinal do lampejo da inspiração.

Túlio é apaixonado pela escrita e confessa que tem muito a agradecer ao Senhor, que é coadjuvado, na terra, pelos parentes e amigos, pois constantemente lhe fornecem bom material para o seu ofício. Ele arremata dizendo:

- Vivo de histórias, recebo valiosa contribuição por bilhetes e e-mails, e até nos encontros sociais. A criatividade popular é imensa; no bojo, é certo, vêm alguns absurdos, mas compreendo perfeitamente o afã de colaborar das pessoas.
Alfredo Domingos

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Ponto de encontro (dos amigos, do papo e da bebida)

Local mais democrático não há: o bar (vulgo boteco). Ponto de encontro do pessoal do copo, da turma dos beliscos e de quem gosta de papear. Sou assíduo frequentador. Vou, até, sozinho e lá me enturmo. Gosto do ambiente. Gosto do falatório que é para ser baixo, restrito, e acaba, pelo conjunto, sendo alto, fora do controle. Ali, como e bebo sem dar satisfação. Trajo-me de qualquer jeito, e está tudo bem. A democracia impera.

Podem ser encontrados todos os tipos. Sei lá, quem chegar será bem-vindo. As pessoas têm a mesma representatividade. Ninguém pode mais ou menos. A bermuda e o copo igualam os presentes. A conversa é que dá o tom e a bebida faz o traço de união (como no hino vascaíno).  É sentar e pedir a cerva bem gelada ou a branquinha (também pode misturar os dois). Isso no início, porque depois o garçom nem precisa ser chamado, já vem trazendo. Um amigo diz que o bom garçom não precisa de convocação e muito menos de oferecer, traz a bebida e pronto. 

O bar, por mais pé-sujo que seja, tem o seu charme. Atrai o cliente por si só. Às vezes, somente pela localização, consegue fazer com que os frequentadores sejam fiéis. Fica próximo a um estádio de futebol, ao lado de uma Escola de Samba ou vizinho de uma faculdade.  Mesmo que a decoração seja “démodé”, com azulejos coloridos, paredes em cores conflitantes, espelhos sem gosto, cartazes escritos a mão, anunciando os pratos do dia, o estabelecimento consegue marcar posição, transbordar de aficionados. O bar parece ter um solo santo. Há pessoas que se benzem ao adentrarem. Caso tenha o Santo colocado na parede, aí a coisa não pode dar errada. Estamos abençoados. São Jorge tem a preferência. Não faltam as velas, os copinhos com café e as moedas aos seus pés. A casa é mantida pelo emocional das pessoas. O estado de espírito reinante dá a voga. Fica tudo propício a acontecer. Desde o início de namoro às apostas, passando pelas brigas acaloradas, normalmente motivadas por futebol ou por cobrança de dívida. O espaço reúne vizinhos, parentes e colegas de trabalho. A conversa vadia flui sem limites, indo pelo caminho da brincadeira, da fofoca e, às vezes, da cobiça à mulher do próximo (não está excluída a cobiça ao marido da próxima, OK?). Acontecem as discussões sobre o último jogo do Maracanã ou do Engenhão, aqui no Rio, os comentários sobre a novela e as críticas à política e à corrupção. É gente que se comporta com simplicidade, dizendo o que dá na veneta, rindo quando há motivo e chorando no embalo da tristeza ou do pileque. Sobram humor, zombaria e amizade. Pode rolar de tudo: declaração de amor, música ao vivo, venda de rifa, lista de casamento, vaquinha para remédio, e, até, infelizmente, contribuição para enterrar o companheiro.

Faço pausa para discordar do mestre Aurélio. No seu dicionário, o verbete “pé-sujo” tem como explicação: “botequim de ínfima categoria”; do que reclamo veementemente. A categoria do pé-sujo é grandíssima! Acaba com ele para ver o que acontece. Praticamente, eclodirá uma revolta! Não mais a da Armada, a da Chibata ou a do Quebra-Quilos, mas a dos Pinguços Sem Pai e Mãe a reclamarem contra a falta da “marvada”.

Geralmente, os aspectos de apresentação e limpeza não são notados. Não há tempo para isso. Ninguém repara. É importante, tão somente, que a cerveja esteja gelada e os acepipes honestos. O estado do banheiro ainda sofre alguma crítica, mas o que vale é poder ser usado “naquela” necessidade urgente.

É grande o meu interesse por nomes. Aprecio lembrar-me dos nomes pitorescos dos botequins. Gosto destes: Bar... Bantinho, Bar... Quinho, Bar... Bicha, Bar da Morena, Bar da Mulata, Boteco do Zé Mané, Boteco do Tutuquinha, Bar do Alemão, que na verdade é do português Joaquim, Botequim do Pelado, Botequim do Coxo (mancava o coitado do Sandoval), Bar Entra Quem Quer, e outros. Lá, na minha Tijuca, existem vários. Despojados, atraem gente de todos os lados e desejos.

As iguarias (considero os pratos servidos, ainda que simples, verdadeiras iguarias) também são variadas, repletas de engenhosidade. Geralmente atendem ao paladar popular, no campo dos tira-gostos. Estão longe de serem “diet” ou “light”, ao contrário, carregam toneladas de gordura, porém, seduzem a galera. Constam dos cardápios: torresmo, jiló frito, ovo cozido colorido, sardinha frita, que fica exposta beijando o vidro da vitrine do balcão, carne-seca desfiada, pastéis e empadas de inúmeros recheios, batatinha, variados escondidinhos, linguiça acebolada, mirabolantes sanduíches e os maravilhosos caldos - feijão, mocotó, ervilha, batata-baroa e muitos outros mais. Em especial, sou fissurado por omeletes. O Bar Paladino, no centro do Rio, prepara uma omelete mista que é dos deuses. Lá, não consigo pedir outra coisa. Com se diz: é de comer ajoelhado, agradecendo aos céus pela dádiva.

O boteco assume o papel de facilitar o entendimento e os negócios das pessoas. Longas conversas são postas literalmente à mesa e acabam dando solução aos problemas, que existiam ou não. É um laboratório para o bem-viver. Trata-se de passaporte para a compreensão da própria vida e a da comunidade. A pessoa deixa de ser ensimesmada. 

Não aceito a desculpa de que ali é local de perdição e vício. Só se perde quem é mesmo torto de nascença. A bebida atua, mas não aniquila. A comida pode enjoar, dar azia, mas não entrega ninguém ao Senhor.

Então, amigo, vamos brindar a cada esquina e abraçar o parceiro como se fosse a última vez! Por que não?

Alfredo Domingos

terça-feira, 7 de abril de 2015

Forte presença em grafite

Fonte da imagem: fotografia feita pelo autor

Este é um grafite anônimo, encontrado numa parede de rua da Tijuca, no Rio de Janeiro. Infelizmente, o grafiteiro não deixou a assinatura, para divulgarmos aqui.

Considerei adequada a publicação, mesmo sem a autoria. Fica, no entanto, a homenagem ao artista “sui generis”, que sai dos ambientes fechados, sob proteção, para deixar a sua marca nas nossas barbas, nos grandes espaços públicos.

Algumas observações sobre a obra são válidas, quase interpretação do grafite: quanto ao retratado, trata-se de homem jovem, contemporâneo ao recado que lhe acompanha; queixo bem pronunciado, num traço irônico, que bem combina com as sobrancelhas desalinhadas e portadoras de diferentes desafios; olhos igualmente satíricos, considerados subjugados às sobrancelhas; sorriso de soslaio, matreiro, avisando mais ou menos assim: estou de olhos e ouvidos aguçados; em vista disso, percebo o destaque dado às orelhas, que se assemelham a duas potentes caixas de som, para captar qualquer coisa, não deixando escapar um “ai” sequer. As rodelas pretas das orelhas poderiam ser brincos, mas prefiro imaginar aqueles alto-falantes que vibram com a música; e para terminar, noto o cabelo bem cortado, denotando zelo pela aparência.

Porém, a mensagem de maior relevância está ao lado da figura. São os escritos. Reflexos da sociedade dos nossos dias: +1 na escola, -1 no crime.

Constata-se uma necessidade e se clama, em paralelo, pela solução da necessidade! É um recado muito atento do artista, utilizando a comunicação que está ao seu alcance.

Alfredo Domingos