sexta-feira, 17 de abril de 2015

Fábula – O fiel escudeiro

Não há outro aio igual ao coelho Ladislau! (até rimou)

Usando apurada sagacidade, segue livrando-se de qualquer encrenca. Um bom expediente aqui e outro acolá, sem perder o humor e a disposição em servir.

Quando o seu dono não consegue resolver alguma dificuldade, lá vem Ladislau com a solução.

Por hábito, fornece ideias por meio de perguntas, evitando o comprometimento direto, para colocar o patrão bem à vontade, sem melindres com as propostas apresentadas por ele, dando chance à reflexão e à percepção de que o teor da conclusão é exclusivamente dele.

Deixa estar, no entanto, que Ladislau induz para aquilo que julga ser o melhor, exercendo peremptoriamente o princípio da lealdade.

O coelho, nos seus botões, sabe do valor da sua influência, mas dispõe de arte bastante para fazer com que o aconselhado fique orgulhoso da possibilidade de sozinho chegar a bom termo.

Várias histórias têm final feliz em consequência da sábia assessoria do coelho. Estão selecionadas, porém, apenas duas para representarem a discreta e eficaz interferência do nosso amigo:

A primeira

- Irei à cidade, mas parece que o céu desabará, de tanta chuva que virá (outra rima). Não sei se levarei o incômodo guarda-chuva – expôs dúvida o dono do coelho.

Mais que depressa, Ladislau atalhou:

- Meu senhor, não carece de preocupação por questão tão banal. Não precisa levar o guarda-chuva, elemento por demais atrapalhante. O senhor não acha que vestindo a capa plástica estará protegendo-se do frio, que tanto lhe incomoda, e ao mesmo tempo preparando-se para a chuva, se ela vier?

- Deixe-me raciocinar, fiel escudeiro... Realmente, cabe o uso da capa, pois ela estará abrigando-me dos dois efeitos da natureza, além de permitir livres movimentos, sem que precise carregar o embaraçoso equipamento. Será o que farei!

A segunda

- Penso em demitir o capataz da fazenda. O homem está velho e, além disso, recebe o maior salário de todos. Meus cofres não estão suportando tamanha despesa. Dividirei as suas atividades pelos outros trabalhadores, que obterão resultado semelhante, continuando com os seus mesmos salários. Terei, assim, alívio financeiro – levantou a hipótese o chefe.

- Tenho observado todas as provas de fidelidade e dedicação por parte do capaz, que conhece como ninguém o andamento da lida, liderando o grupo com competência, além de ter pessoalmente salvado um dos seus bezerros, arriscando a própria vida, quando o animal jogou-se no rio. O homem não está velho, imprestável; na verdade, possui larga experiência. Acrescento, ainda, que não podemos esquecer que a filha do capataz é cozinheira de mão cheia, de cujo fogão saem delícias para o seu regalo, meu patrão. Fica a pergunta: o senhor está avaliando a perda de um valoroso auxiliar e, também, a falta que Rosinha lhe fará por não estar mais à frente dos maravilhosos quitutes? Reconheço, contudo, que as finanças da fazenda são da sua alçada. O que sabe um desavisado coelho sobre contas? - arrematou o ladino Ladislau.

Em seguida, o patrão alegou a necessidade de analisar com mais detalhes a decisão que estava por tomar.

Havendo dúvida, a pessoa sensata pede tempo. Trata-se de excelente medida. Dar tempo ao tempo é uma das saídas inteligentes para qualquer tema, a não ser que seja providência de momento, inadiável.

Para fechar o assunto, claro, que o capataz não foi demitido!

Moral da história: a opinião pode surtir efeito ou não, basta ser fundamentada em argumentos pertinentes. Quem está com o problema, às vezes, não considera todos os aspectos. Nesse momento, alguém de fora pode ajudar. Cabe ao aconselhado avaliar e decidir, sem pressão, ficando confortável quanto a sua decisão, que tem cunho estritamente pessoal. A partir daí, pronto, quem aconselhou fica isento.

O segredo é permitir ao outro a oportunidade de refletir e por si só encontrar o caminho a seguir.

 Alfredo Domingos

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